14/07/2021
Se pudesse escolher, você confiaria o projeto e a construção de uma edificação, sua casa por exemplo, a quem tem pouca formação na área? Pois bem, essa é a pergunta que escolhemos para convidar a sociedade a refletir e discutir conosco sobre segurança de edificações e o papel dos profissionais habilitados neste contexto.
Recentemente o Conselho Federal dos Técnicos Industriais (CFT) entregou à Secretaria de Governo da Presidência da República (SEGOV) uma sugestão de projeto para alterar o Decreto nº 90.922/85, que dispõe sobre o exercício das profissões de Técnico Industrial e Técnico Agrícola de nível médio.
Em linhas gerais, a proposta é para ampliar as atribuições dos Técnicos de nível médio em Edificações e em Construção Civil, para que possam realizar atividades de projeto, cálculo, direção e execução dos serviços em edificações, dos atuais 80m² que são autorizados, para 300m² de área construída.
A questão fundamental aqui a se refletir é acerca dos limites que a busca pelo mercado de trabalho deve respeitar, para que haja um devido equilíbrio entre a formação (o nível que se estuda) e as possibilidades de exercício das profissões, de modo a não haver graves problemas de risco à segurança das pessoas. A pergunta crucial a se fazer é se a formação adquirida pelo egresso de nível médio (antigo segundo grau), que se confere por meio dos conhecimentos necessários sobre física, cálculos diferencias e integrais, resistência dos materiais, dinâmica, entre outros, é suficiente para se projetar e executar edificações de 300m² de área com segurança, estabilidade e durabilidade. Esse tipo de edificação envolve uma grande complexidade e variáveis que devem ser devidamente equacionadas de forma adequada.
Entendemos que 1.200 horas de formação de um curso técnico de nível médio são insuficientes para conferir todos os conhecimentos técnicos e científicos necessários ao desempenho de atividades profissionais de tal envergadura, acarretando grandes riscos à sociedade.
O planejamento e execução de edificações urbanas ou rurais demanda conhecimentos profundos e precisos na área da engenharia, que tragam segurança e sustentabilidade nos processos produtivos da construção civil e na exploração de recursos ambientais. As formações de nível superior nas diversas modalidades das Engenharias contam com conceitos de desenvolvimento de competências e metodologias de ensino que organizam a complexidade necessária para um cuidadoso exercício profissional em mais de 3.600 horas e, normalmente, cerca de cinco anos de profundos estudos, atividades práticas, estágios e experimentações. Os estudantes de graduação em faculdades e universidades só conquistam o diploma e o título de Engenheiros após dominarem com destreza e desenvoltura as Ciências Exatas, Tecnologia das Construções, Estruturas e Materiais, Geotecnia, Hidráulica e Saneamento, entre outras áreas de conhecimento tecnológico.
Entendemos que o papel dos técnicos de nível médio é importante e tem seu espaço na construção civil fortemente ligado à concepção e execução auxiliar das soluções criadas e planejadas pela engenharia. Este é o foco de sua formação.
Conselho profissional é órgão de defesa dos interesses sociais e humanos! Há que se considerar riscos de uma proposta que, se for aprovada e tornar-se lei, poderá trazer riscos incalculáveis à sociedade.
Inaceitável a justificativa de que a proposta se baseia “em uma pesquisa feita com os técnicos” e que “é um desejo antigo”. Sobrepõe-se a estes interesses privados da categoria dos técnicos de nível médio a segurança das edificações e, por conseguinte, das pessoas que farão uso de tais edificações.
Uma situação como esta, que envolve segurança social, não pode ser pautada por vontades e interesses de um grupo apenas, mas sim pela ciência e por uma profunda discussão na acadêmica e com todos os envolvidos na questão, não apenas uma parcela de interessados no assunto.
Posicionamo-nos frontalmente contrários a este impensado Projeto de Lei. Pedimos aos parlamentares do Congresso Nacional que reflitam acerca das inconsistências deste PL, que privilegiem a ciência em detrimento da busca insana de espaços no mercado de trabalho e que protejam a segurança e a vida das pessoas.
Por Ricardo Rocha, presidente do Crea-PR