19/04/2021
No dia 31 de março de 1964, tropas militares marcharam de Juiz de Fora para o Rio de Janeiro com o objetivo depor o governo de João Goulart, presidente brasileiro à época. Esse foi o começo de um período de ficaria marcado na memória dos brasileiros. No dia 2 de abril de 1964, o presidente do Senado declarava vagas a presidência e a vice-presidência da República, empossando o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, na presidência da República. O ato teria implicações na vida dos brasileiros nos próximos 21 anos.
O que aconteceu durante o período de 1964 a 1985 é alvo de debate político até os dias atuais. Há quem defenda que o que ocorreu foi uma revolução e não uma ditadura militar, como historiadores conceituam. “A Historiografia em si considera como ‘revolução’ todo e qualquer movimento que resulte em transformações políticas, econômicas e/ou sociais num curto período de tempo. Sendo assim, o golpe civil-militar de 1964 não se configura como uma revolução. Afinal, trata-se de um processo de caráter conservador, que objetivava justamente evitar transformações que supostamente ocorreriam no Brasil, arquitetadas por um governo que, na visão dos militares, estaria alinhado ao comunismo soviético”, explica o historiador Cássio Luige.
Fernanda Ribeiro Haag, mestre em Linguagens e Sociedade e doutoranda em História Social, destaca que chamar esses eventos de revolução, justificando que visavam pacificar o país e protegê-lo da “subversão” ou do “comunismo”, não encontra sustentação conceitual. “Se nos atermos às discussões conceituais vemos que revolução é uma mudança radical nas estruturas de determinada sociedade, vide exemplos da Revolução Haitiana ou Francesa. Ora, a estrutura social brasileira não foi modificada pela chegada ilegal dos militares ao poder em 1964. O conceito de golpe se aplica muito mais ao Brasil de 1964. O cientista político Álvaro Bianchi fala sucintamente que o golpe de Estado ‘é uma mudança institucional promovida sob a direção de uma fração do aparelho de Estado que utiliza para tal de medidas e recursos excepcionais que não fazem parte das regras usuais do jogo político’”, destaca.
Para o historiador Ricardo Carvalho, chamar de revolução o Golpe de 1964 é fazer um eufemismo político. “É uma tentativa de disfarçar o caráter autoritário, inconstitucional. E como a gente diz, um estado de exceção que se estabelece no Brasil, desrespeitando toda a ordem democrática. Isso é comum. Os ditadores nunca vão se autointitular de ditadores”, disse.
Atos institucionais
Uma das características deste período foi a promulgação de atos institucionais (AI). “Os atos institucionais tinham como intenção legalizar o que era ilegal. Dar uma aparência constitucional não prevista nas constituições – a constituição em vigor no caso do Brasil era a Carta de 1946 que ainda vigorava – e transformar atos autoritários em medidas com aparência institucional. Em resumo, legalizar medidas ilegais”, comenta Ricardo.
Durante o período foram promulgados 17 atos institucionais, regulamentados por 104 atos complementares, e que garantiram uma forte centralização administrativa e política do Brasil. “Os impactos dos atos foram em vários setores, desde alterar a forma de escolha de presidentes, o sistema partidário, a abertura ou não do Congresso até mesmo afetando os direitos básicos dos cidadãos: liberdade de expressão, direito de ir e vir, direito a Habeas Corpus, exigência de mandado para prisão”, relata a socióloga da UniAcademia, Luciana Haider.
O mais lembrado é o AI-5, mas outros AIs também foram importantes na história brasileira. “O AI-1, nomeado dessa forma somente depois do decreto do AI-2, expedido em 9 de abril de 1964, ou seja, dias após o golpe, concedeu ao comando militar a possibilidade de cassar mandatos legislativos e suspender direitos políticos. Por conta disso, nomes como João Goulart, Jânio Quadros, Luís Carlos Prestes, Leonel Brizola, entre outros, tiveram seus direitos políticos cassados, além de inúmeras perdas de mandatos parlamentares”, conta a historiadora Fernanda.
Outro ato institucional foi o AI-2, de 1965. “Ele recrudesceu o autoritarismo e decretou a eleição indireta para a presidência da República, além de estabelecer a dissolução de todos os partidos políticos existentes e dar poderes ao presidente da República, após ouvir o Conselho de Segurança Nacional, de decretar estado de sítio no país por 180 dias sem consultar o Congresso. Em um ato complementar, instaurou-se o bipartidarismo”, relata Fernanda.
Os historiadores classificam o AI-5 como o que intensificou ainda mais a repressão, que já existia. “O AI-5 é Ato Institucional mais lembrado pelos brasileiros e não à toa, pois ele marca o fechamento do regime e uma ascensão vertiginosa da repressão. Editado em 13 de dezembro de 1968, o AI-5 autorizou o presidente da República, independentemente de qualquer apreciação judicial, a decretar o recesso do Congresso Nacional e de outros órgãos legislativos, a intervir nos estados e municípios sem as limitações previstas na Constituição, a cassar mandatos eletivos e a suspender por dez anos os direitos políticos de qualquer cidadão, a decretar o confisco de ‘bens de todos quantos tenham enriquecido ilicitamente’ e a suspender a garantia de habeas-corpus. Sem perder tempo e no mesmo 13 de dezembro por decorrência do AI-5, foi decretado o recesso do Congresso Nacional por tempo indeterminado”, relata Fernanda.
Censura
Com o AI-5, a censura passou a atuar com mais intensidade, censurando a imprensa nacional de divulgar fatos que desagradavam o governo vigente. “Não era difícil encontrar nas primeiras páginas dos jornais da época receitas de bolo, trechos de “os Lusíadas” ou simplesmente espaços vazios. Ali estavam publicações consideradas subversivas e retiradas do jornal antes da publicação”, comenta Cássio.
O Jornal da Tarde, de São Paulo, foi um dos afetados durantes o período. Já na edição, em que noticia o AI-5, o jornal publicou uma previsão de tempo que ficou famosa descrevendo que haveria tempestades e nuvens negras, uma referência à ditadura.
No livro “Jornal da Tarde – Uma ousadia que reinventou a imprensa brasileira”, Ferdinando Casagrande conta que o editor Ruy Mesquita teve a ideia de colocar receitas que não funcionavam no lugar de matérias censuradas, para alertar o leitor de que algo estava estranho. Em algumas receitas, haviam críticas veladas ao regime e a apoiadores como a receita de frango ao passarinho, uma clara referência ao senador Jarbas Passarinho, a famosa receita “Lauto Pastel”, em referência ao governador Laudo Natel e uma página inteira intitulada “Receitas do Alfredo’s”, em referência ao ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, considerado um dos mentores intelectuais da censura.
Esses atos durante a ditadura foram realizados porque o jornal não podia publicar notícias que não eram agradáveis ao governo. “Para quem acredita que a criminalidade era menor na época da ditadura, é importante lembrar que problemas sociais, políticos e econômicos eram prejudiciais à imagem do governo. Sendo assim, estas notícias eram censuradas”, disse o historiador Cássio.
No livro, Ferdinando Casagrande relata que notícias de segurança e saúde, como o envenenamento de crianças em uma escola do interior e o surto de meningite que começava a crescer em São Paulo, foram censuradas. Na área política, a renúncia do ministro de Agricultura, Cirne Lima, não foi publicada. O jornal pode publicar apenas a substituição do ministro, sem explicar aos leitores que a substituição ocorreu porque o ministro discordou do ministro da Fazenda, Delfim Netto. Somente no ano de 1968 foram 200 matérias censuradas.
E foi essa censura que fez com que casos de corrupção não tivessem destaque. A historiadora Fernanda conta que casos de corrupção aconteceram, e chegaram até serem publicadas, mas muitas informações foram censuradas. “Impedir notícias sobre corrupção fazia parte da própria estratégia do regime de propaganda e de segurança nacional, pois a imagem dos militares e seus aliados não poderia ser arranhada”, conta.
Outra situação é que a corrupção ocorria diretamente com os ministérios. “Um exemplo disso é exatamente as grandes empreiteiras, que cresceram muito nessa época e relacionadas diretamente a acordos e corruptelas com o regime. Tudo ligado às famosas obras faraônicas realizadas. Uma boa indicação de leitura sobre isso é a obra Estranhas Catedrais: As Empreiteiras Brasileiras e a Ditadura Civil-Militar (1964-1988)”, explica.
Há ainda muitos casos documentados. “Alguns casos se tornaram famosos e foram documentados, principalmente, aqueles de superfaturamento, desvio de verba, abuso de autoridade e tráfico de influências. O portal http://memoriasdaditadura.org.br/ (uma referência importante na divulgação das pesquisas sobre a época) relembra dois casos simbólicos: o “Escândalo Lutfalla” durante o governo Geisel, que envolveu empréstimo de dinheiro público para uma empresa em situação de falência, mesmo depois do BNDES ser contrário ao empréstimo; e o “Caso Delfin” no governo Figueiredo, quando os ministros Delfim Neto (Planejamento) e Ernani Galveas (Fazenda) teriam favorecido o grupo Coroa-Brastel (também falido), desviando empréstimos concedidos pela Caixa Econômica Federal”, relata.
Economia: Crescimento sem desenvolvimento
Obras faraônicas, investimento em infraestrutura e uma grande industrialização são usualmente justificativas usadas para defender o período militar. No entanto, o alto gasto público fez com que o Brasil tivesse o conhecido “Milagre Econômico”, um período de muito crescimento econômico, com aumento do Produto Interno Bruto (PIB), mas um baixo desenvolvimento, com baixa na qualidade de vida da população. O período deixou como consequência uma década de 1980 de muita dificuldade, especialmente com a inflação.
A economista Pollyanna Rodrigues Gondin explica que no período do “Milagre Econômico”, o PIB brasileiro chegou a taxas acima de 10%. “Os resultados consideráveis em relação ao PIB brasileiro foram decorrentes dos incentivos à industrialização (subsídios e incentivos fiscais), dos investimentos em infraestrutura que já vinham ocorrendo, políticas de incentivo à exportação, abertura ao capital externo e algumas reformas políticas. Um dos resultados foi o expressivo crescimento da indústria de transformação. Como dito anteriormente, o PIB expressa o crescimento econômico, de modo que um país pode crescer, mas ao mesmo tempo não se desenvolver. E foi exatamente o que aconteceu com o nosso país”, conta.
Mas do outro lado, a vida do brasileiro continuava a ser difícil. “Na verdade, houve uma piora significativa de indicadores sociais (desenvolvimento econômico), o que faz, de modo geral, se questionar a veracidade do período conhecido como ‘Milagre Econômico’. Uma das consequências mais gritantes da ditadura militar foi o aumento da desigualdade social. Para além disso, a falta de acesso da população à dados públicos, aumento da concentração de renda, inflação e aumento do endividamento externo. Durante a ditadura muito se falava em ‘deixar o bolo crescer para depois distribuir seus pedaços de forma igualitária’. Em outras palavras, o que se afirmava era ‘primeiro, promoveremos o crescimento da nossa economia, e depois, distribuiremos essa renda com a população’. Isso de fato não ocorreu”, relata Pollyanna.
O economista Vinícius Machado explica a realidade da época por meio de números. “Embora nos primeiros 10 anos do regime, entre 1964 até 1974, a taxa média de crescimento tenha sido de quase 10%, chamado de milagre econômico, o investimento público saiu de 15% do PIB para 23%. Tudo isso parece excelente, contudo, o crescimento foi financiado por dívida externa e pelos pobres”, afirma. “O bolo cresceu, e o PIB per capita foi de US$ 261 em 1964 para US$ 1.643 em 1985, isso dava força ao regime com a alcunha de vencedor ao regime. Contudo, os mais pobres viram a sua renda corroída no período com o poder de compra do salário mínimo: em março de 1964 era o equivalente a R$ 1,2 mil, mas ao final do regime, em 1985, o salário mínimo era de R$ 620, em valores atualizados”, destacou.
Os reajustes salarias eram feitos pelo governo, mas resultavam em um poder de compra cada vez menor. “O governo determinava os reajustes salariais e esses, de modo geral, eram mais baixos que a inflação, uma vez que, os militares modificaram a forma de reajuste salarial (pela inflação) e repreenderam os sindicatos, diminuindo os movimentos e poder de negociação dos trabalhadores. Isso era feito como modo de conter o aumento dos preços no futuro e ao mesmo tempo, reduzir os custos trabalhistas, o que ficou conhecido como ‘arrocho salarial’ por corroer o poder de compra dos trabalhadores”, explica a economista Pollyana.
Quando a década de 80 chegou, a situação econômica piorou. “A década de 1980 apresentou uma taxa média de crescimento econômico de 2,9%, representando uma queda drástica em relação à década anterior. Para além disso, a inflação também sofreu um avanço considerável, chegando a 223% no ano de 1985, e a mais de 2.000% anual antes da implementação do Plano Real em 1994”, lembra a economista.
Outra dificuldade dos anos 80 foi consequência da dívida externa durante o período militar. “A dívida externa aumentou, em decorrência das medidas que iam sendo tomadas, facilidade de crédito e, consequente aumento dos empréstimos decorrentes do período de Ditadura. Ou seja, o crescimento econômico ocorrido nessa época, em grande parte, baseou-se no empréstimo externo. Entretanto, com a crise internacional instaurada pelo Choque do Petróleo, a economia brasileira passou a enfrentar dificuldades. E a dívida externa que representava 15,7% do PIB em 1964, passou a 54% do PIB no ano de 1984”, explica Pollyana.
O resultado foi prejudicial à economia brasileira. “As próximas gerações pagariam e precisariam conviver com a alta dívida do país, que saiu de US$ 3 bilhões em 1964 para US$ 102 bilhões em 1984, cerca de 50% do PIB à época. Depois do real, parte dessa dívida em dólares foi ‘trocada’ por dívida em reais e até hoje somos um dos países em desenvolvimento com a maior dívida no mundo”, comenta Vinicius.
Fim da ditadura
Mas mais do que a situação econômica, as consequências da ditadura militar no Brasil são discutidas até os dias de hoje. Uma das razões é a forma como a ditadura terminou. O Brasil passou por um processo de reabertura que iniciou no fim da década de 70 e se arrastou até a década de 80, culminando na promulgação da Constituição de 88, vigente até hoje.
O historiador Ricardo Carvalho destaca que ainda há uma discussão entre os pesquisadores sobre como o período militar terminou. “Há quem diga que foi o próprio desgaste do modelo econômico, o famoso Milagre Econômico do regime militar. Outros dizem que existia um desejo de determinados setores liberais de assumir o comando da nação, pelo fracasso do modelo econômico do próprio estado autoritário. Mas há uma teoria que me parece interesse que é a dialética da repressão. Os próprios colaboradores do golpe, como o governo dos Estados Unidos da América, teriam ajudado nessa pressão. O que é a dialética da repressão? É que quanto mais você reprime, mais ela faz se desenvolver também dentro da estrutura, os movimentos de oposição. É como um pai autoritário que quanto mais ele oprime, censura a liberdade do filho, mais o filho busca caminhos não tradicionais para manifestar a sua liberdade. Há quem defenda que o excesso de repressão da ditadura acabou favorecendo o surgimento de muitos grupos de oposição e alguns que, inclusive, atuavam na clandestinidade. Havia a defesa da necessidade do processo de abertura, até para diminuir a força desses setores da oposição”, explica.
Diferente de outros países, como Argentina e Chile, o Brasil não teve um julgamento de militares que estiveram envolvidos em torturas. Em 2011, uma Comissão Nacional da Verdade foi criada e chegou a investigar fatos do período militar. Mas por causa da Lei da Anistia, de 1979, que anistiou pessoas exiladas e também militares, não houve um julgamento com punição a torturadores.
A historiadora Fernanda explica que a Lei da Anistia começa a ser discutida em meados de 1970, especialmente com familiares de presos, desaparecidos e exilados da ditadura. Em 1979, a lei é promulgada. “A lei excluía os chamados (pelo próprio regime) ‘terroristas’, então muitos presos políticos não foram anistiados, acabaram saindo por mudanças na Lei de Segurança Nacional e por terem cumprido suas penas. De toda forma, muitos exilados políticos conseguiram retornar ao Brasil, o que foi, claro, uma conquista”, explica.
Porém, a lei encontra críticas, já que os torturadores não foram julgados. “A Lei da Anistia deixou muitas feridas abertas na memória brasileira, pois vítimas de tortura não encontraram sua reparação e ao mesmo tempo seus torturadores foram anistiados e não sofreram consequências por seus atos hediondos. A consequência disso é que tivemos uma justiça de transição falha no Brasil e muitos não tiverem o direito por Memória, Verdade e Justiça garantidos. Isso faz com que vejamos ainda hoje homenagens a torturadores, manifestações que defendem o AI-5 e clamam por intervenção militar, vemos ainda comemorações do golpe de 1964”, conta.
A Comissão da Verdade de 2011 tentou trazer alguma reparação, mas sofre críticas. “Eu concordo que houve um erro nessa tentativa de restabelecer os fatos históricos por meio da Comissão da Verdade. O erro não está em criar a Comissão, mas o de fazer concessões para acomodar uma insatisfação em parte dos integrantes da elite das Forças Armadas do país. Idealmente deveríamos ter alcançado o maior grau de aprofundamento nessa questão e tratado o tema de forma mais aberta e transparente para a sociedade. De qualquer forma, a Comissão foi até onde a nossa capacidade para encarar o problema suportou. Às vezes, um relacionamento termina sem que as duas partes conheçam exatamente o que cada uma delas pensava, sentia e fazia”, conta o cientista político, Luiz Renato Ribeiro Ferreira.
Mesmo assim, para a historiadora Fernanda, a Comissão teve importância na história brasileira. “A Comissão Nacional da Verdade, mesmo sem poder de judicialização, foi importante para tentar reconstruir essa história e apontou, a partir de pesquisa e ampla documentação, 377 agentes responsáveis por graves violações de direitos humanos. E mesmo assim a CNV sofreu intensos ataques, demonstrando o problema de um país que não lida com um passado marcado por violências e atrocidades cometidas pelo próprio Estado”, disse.
Consequências
O período militar ficou marcado na história brasileira e as ações tomadas à época trazem impactos até os dias atuais. Para a historiadora, a principal mudança foi a transição democrática realizada, que apesar de lenta, trouxe mudanças significativas na sociedade brasileira. “Com isso tivemos a promulgação da Constituição Federal de 1988 que assegurou direitos importantes, como a criação e institucionalização do SUS, pois passa a ser dever do Estado garantir saúde a toda população brasileira, ou ainda a proposta que tornou a prática do racismo crime sujeito a pena de prisão, inafiançável e imprescritível. Mas também desagradou setores liberais, com a manutenção de algumas premissas nacionais-estatistas, e setores da esquerda, por não priorizar a Reforma Agrária ou atender reivindicações históricas, como a jornada de 40 horas semanais”, explicou.
O historiador Ricardo destaca que a desigualdade social foi um legado deixado pelos militares. “As consequências do Milagre Econômico foram duras, mas houve um crescimento razoável do desenvolvimento global do Brasil que abriu caminho, infelizmente, para os anos 80, a chamada década perdida. O grande impacto foi a perda de 21 anos de amadurecimento das instituições democráticas, das representações populares e civis no poder, da educação brasileira que foi tolhida na sua liberdade de manifestação e expressão, da violência contra artistas e intelectuais”, conta.
O cientista político Luiz Renato destaca que a principal consequência é que uma parcela da população tem dificuldade em conseguir buscar, dentro da democracia, os ajustes necessários para melhorar a vida no país. “É recorrente a existência de pessoas que fazem elogios à ditadura sempre que uma crise mais grave aparece, pois compreendem que a força e a violência são as únicas opções diante dos desafios que encontramos. Um dos formuladores da democracia, Montesquieu, imaginava que quando os freios institucionais falhassem, o povo seria a última resistência contra as ditaduras. Hoje essa ideia, também defendida por outros pensadores, vem sendo colocada em dúvidas, pois cada vez mais aparecem pessoas defendendo o rompimento da ordem democrática”, relata.
Entretanto, o historiador Ricardo destaca que é por meio da democracia que o país realmente poderá encontrar um futuro. “Ao final dos 21 anos de ditadura ficou realmente a certeza de que um país só se constrói com participação, com liberdade, com democracia. Realmente, ditadura nunca mais. Isso não é uma mera frase de efeito de nenhum militante. É uma necessidade de uma nação que ela se construa com democracia, com liberdade, com participação”, disse.
Texto: Karin Franco
Fotos: Acervo do Senado Federal