Um pedido de socorro em meio ao caos

Por Redação 4 min de leitura

Era uma casa muita engraçada. Tinha teto, mas não tinha nada. Ninguém podia entrar nela não, porque a moradora não deixava não. Assim como na casa eternizada pelo poeta Vinícius de Moraes na cantiga, a casa localizada no alto de Irati se destaca das diversas outras que estão ao redor por não ter nada. Ninguém podia tomar banho quente, porque água e luz não tinha não. Ninguém podia comer ali, porque comida não tinha não. Mas, assim como na cantiga, a casa é feita com muito esmero pela Maria*.
O esmero aparece nas letras garrafais escritas em vermelho e preto em painéis de madeira, tecido e outros materiais. Também na própria casa e nos muros. Quem passa por ela, logo percebe que ali mora alguém com vontade de falar. Alguém que pede socorro.
Maria reside nessa casa há muitos anos. Foi nessa casa que viveu com sua mãe até que ela desse o seu último suspiro. Ali, hoje ela vive sozinha. Não tem água e nem luz, come quando dá. A comida vem aos poucos. De quilo uma vez ao mês, quando vem. Seus amigos são os gatos e é com eles que ela divide o alimento, as dores e a vida. O portão da casa nunca fica trancado, mas lá dentro só entra quem ela convida. Coisa que raramente acontece.
Ao bater a porta, quem atente é uma mulher de aproximadamente 56 anos. Com traços expressivos, aparência bem cuidada, a mulher loira ainda demonstra jovialidade e possui uma fala eloquente. Mas é só no contar a sua história de vida que percebemos que a fronteira entre o real e o imaginário está confusa. Ao falar sobre sua vida, às vezes sorria, em outras vezes, suas palavras ficavam embargadas e as lágrimas enchiam os seus olhos. É difícil saber o que é real e o que é imaginário, se as acusações são verdadeiras ou não, mas esta é a história de Maria, contada por ela.
O protesto pela herança
Quem passa pela rua onde ela mora fica curioso ao ver tantos letreiros espalhados pela fachada da casa. Nesses cartazes estão desabafos, pedidos de comida e de ajuda. “É um protesto mesmo, contra os colarinhos brancos, porque desde pequena eles judiaram de nós”, afirma Maria, misturando a realidade com o imaginário.
Ela conta que sua vida mudou logo após a morte da mãe. Ela ficou sozinha, mesmo tendo uma família com muitos irmãos. A ideia de fazer um protesto surgiu há três anos. Após pensar em sua vida e em seu sofrimento, ela resolveu gritar para o mundo o que supostamente aconteceu. “O protesto começou em setembro de 2015 como está ali, [apontando para o canto da parede] eu não deixo meu protesto cair. Caiu um pano eu coloco outro, porque assunto não me falta”, explica.
No seu imaginário, ela sonha com uma herança. Segundo ela, a família de sua mãe, de sobrenome conhecido na cidade, lhe deve. Através desse protesto, ela quer que o dinheiro dessa herança chegue até ela. “Eu não vou parar com o protesto enquanto eu não receber o meu dinheiro. Então, eu pedi uma revisão da herança, eu quero uma revisão”, diz.
As frases escritas por Maria são feitas com carvão e óleo. “Eu já fui protestar no controle da nação. Ergui uma faixa vermelha no meio da rua para eles não pensarem que o meu protesto era só aqui, que não era só de fundo de quintal. Mostrei para eles que eles não iriam me intimidar”, conta citando uma viagem