30/08/2022
É comum durante os períodos eleitorais encontrarmos informações equivocadas sobre os efeitos dos votos brancos, nulos e também sobre a segurança das urnas eletrônicas. É mentira que se a maioria dos votos for brancos/nulos a eleição é invalidada. O advogado e ex-juiz do TRE-PR Roberto Ribas Tavarnaro e o chefe do Cartório Eleitoral Rebouças Marco Aurélio Canever explicam sobre as categorias de votos, desmentem boatos sobre as eleições e orientam os eleitores sobre os critérios a utilizar para escolher seus candidatos
A falta de conhecimento de muitos eleitores vem à tona a cada dois anos quando ocorrem os períodos eleitorais no Brasil. Muitos cidadãos ainda têm dúvidas sobre a diferença do voto branco e do voto nulo, que, em resumo, não são contabilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, desinformação e notícias falsas têm se espalhado pela internet afirmando que esses votos podem, inclusive, anular uma eleição inteira – o que é mentira. Outro tema que se destaca durante este período é a segurança das urnas eletrônicas, assunto que pode ser facilmente encerrado com algumas checagens permitidas pelo próprio TSE.
Voto em branco
O voto em branco é considerado inválido e não interfere no resultado das eleições. Na prática, o eleitor está abrindo mão do seu voto não escolhendo um representante. “O eleitor pode ter uma escolha para um determinado cargo e não para o outro. Se o eleitor não tem uma escolha definida, existe a opção de o eleitor votar em branco para um cargo e votar em alguém no outro”, explica o analista judiciário e chefe do Cartório Eleitoral Rebouças, Marco Aurélio Canever.
Já o advogado e ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), Roberto Ribas Tavarnaro, comenta que houve a modernização do sistema eleitoral brasileiro, mas o voto em branco continua com o mesmo significado. “Voto em branco é aquele em que não há nenhuma manifestação de preferência do eleitor. Antigamente, para votar em branco, bastava que o eleitor não fizesse qualquer anotação na cédula de papel. Agora, ele deve pressionar a tecla ‘branco’ e confirmar”.
Voto nulo
Para entender quando o voto será nulo, é necessário compreender o que é um voto válido primeiro.
Na eleição de prefeito, governador e presidente da república, o número do candidato corresponde ao número do partido pelo qual ele está concorrendo. São sempre dois números. Esses cargos têm a disputa pelo princípio majoritário, ou seja, os candidatos que têm o maior número de votos são eleitos, inclusive com possibilidade de segundo turno.
O candidato a senador também obedece ao princípio majoritário, no entanto, o candidato é identificado na urna pelos dois algarismos do partido pelo qual ele concorre, mais outro algarismo, totalizando três números. “Os cargos de senador, governador, presidente da república e prefeito, que são os cargos majoritários, não é admitido o voto em legenda. O eleitor precisa colocar todos os números correspondentes para selecionar o candidato desejado”, explica Canever.
👉 Receba as notícias do Hoje Centro Sul no seu celular
Por sua vez, nas eleições proporcionais, que são para os cargos de vereador, deputado estadual e deputado federal, é admitido o voto em legenda. “No caso de vereador e de deputado estadual, são sempre cinco números, ou seja, os dois primeiros são o número do partido pelo qual ele está concorrendo, e os três seguintes, números aleatórios. No caso do deputado federal é a mesma coisa, mas com apenas dois números a mais. Se o eleitor digitar na urna os dois primeiros números correspondentes a algum partido em disputa, o seu voto já vai para esse partido, ou seja, para a legenda pela qual o candidato está concorrendo, e aí o voto já não será nulo. Se ele acertar os outros números, o voto vai para um candidato, é o chamado voto nominal”, detalha Canever.
Ao contrário do voto em branco, que pode ser utilizado quando o eleitor não escolheu um candidato, o voto nulo refere-se basicamente em não votar em ninguém. “O voto nulo representa uma manifestação de descontentamento do eleitor com os candidatos. São considerados nulos os votos em que o eleitor digita um número de candidato (ou partido, no caso da eleição proporcional) inexistente e confirma. Os votos nulos e os votos em branco não anulam a eleição. Atualmente, ambos são considerados votos não válidos e não acarretam qualquer consequência na apuração dos eleitos e nas eleições em geral, independentemente da quantidade de votos dessa natureza”, detalha Tavarnaro.
A semelhança entre voto nulo e branco é que eles não são contados para a definição de quem é eleito. A Justiça Eleitoral, na hora de calcular quem é eleito, desconsidera os votos brancos e nulos, ou seja, apenas os votos válidos são computados para definir a eleição, seja da legenda, do partido ou dos candidatos. “Como ambos são considerados votos não válidos, não há qualquer diferença ou relevância para fins de apuração de resultado. A única diferença que existe é, em tese, a da motivação, pois o voto em branco pode representar falta de preferência e o voto nulo pode significar um protesto do eleitor”, acrescenta o chefe do Cartório Eleitoral. Por isso, apesar dos boatos, mesmo quando mais da metade dos votos forem nulos, não é possível cancelar uma eleição.
Voto no Brasil: Direito ou obrigação?
Apesar de o voto ser obrigatório para a maioria dos cidadãos adultos brasileiros, a Constituição Federal vigente em nosso país prevê o regime democrático representativo, por meio do qual o povo elege seus representantes a partir do voto de várias pessoas, ou seja, o eleitor tem o direito reconhecido de expressar o seu desejo nas urnas e escolher quem ele quer que cuide da administração do dinheiro público pelos próximos anos.
Para Canever, o cidadão que desperdiça o seu direito de votar, seja não comparecendo à seção, seja votando em branco ou nulo, está aceitando que os outros escolham por ele. “Há quem diga que o voto nulo ou branco é um voto de protesto, mas eu sempre gosto de mencionar para que a pessoa compreenda os efeitos desse voto, que tanto o voto em nulo e tanto o voto em branco, correspondem ao ato de não votar. Não expressar uma escolha, ou ainda votar em todo mundo, dizer ‘tanto faz’. O eleitor que vota em branco ou anula o seu voto na urna está praticamente dizendo: ‘Para mim tanto faz, quem vier está bom’. Ele não faz uma escolha, já que esse voto não tem utilidade nenhuma. É a mesma situação do eleitor que não foi votar. A maioria que vota válido é que vai definir o rumo da administração do município, do estado e do país”, argumenta.
Segurança das urnas
Outro assunto bastante debatido principalmente durante os períodos eleitorais é a segurança das urnas eletrônicas. Essa questão mexe com o imaginário das pessoas e acende discussões na imprensa e nas redes sociais.
De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a Justiça Eleitoral utiliza o que há de mais moderno em termos de segurança da informação para garantir a integridade, a autenticidade e, quando necessário, o sigilo. Além disso, há diversos mecanismos de auditoria e verificação dos resultados que podem ser efetuados por candidatos e coligações, pelo Ministério Público (MP), pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo próprio eleitor.
Outro mecanismo bastante simples de verificação é a conferência do boletim de urna impresso. Ao final da votação, o boletim com a apuração, no qual são contabilizados todos os votos de uma seção eleitoral transforma-se em documento público e costuma ser colado na porta do local de votação. O resultado de cada boletim pode ser facilmente confrontado com aquele publicado pelo TSE na Internet, explica Tavarnaro. “De uma maneira muito simplista, as urnas eletrônicas são, cada uma, um computador, que recebe e acumula os votos sem vinculá-los a cada eleitor. Ao final da votação, é extraído um arquivo que contém as informações sobre os votos em uma mídia e também é impresso um documento que demonstra quantos votos cada candidato recebeu naquela urna, o chamado Boletim de Urna. O Boletim de Urna é afixado em edital e entregue aos fiscais [dos partidos políticos] presentes, ao passo que a mídia é encaminhada à Justiça Eleitoral para contabilização dos votos em conjunto com as outras urnas. Como a urna não tem conexão com a internet, esse último processo é realizado manualmente, ou seja, a Justiça Eleitoral desloca-se do local de votação até a sede para realizar a totalização dos votos”, descreve.
Escolhendo o candidato
Como decidir em quem votar? Quais critérios devem ser levados em conta para escolher um candidato?
“É lógico que não é fácil. Pessoalmente eu vou atrás das propostas, vou atrás do histórico da pessoa, vou ver o que ela já fez, se as ideias que ela defende batem com as ideias que eu defendo, se ela já foi envolvida em algum esquema de corrupção; se já foi uma pessoa política, como ela votou nos projetos de lei quando teve aqueles projetos polêmicos, de que lado ela ficou? É o lado que eu gostaria que ela ficasse? É igual aquele ditado: diga-me o que tu faz, que eu direi o que tu és”, avalia Canever.
No ponto de vista dele, a melhor maneira de protestar é exercendo o direito de escolha. “Às vezes as pessoas me perguntam sobre o voto de protesto. Votar em alguém que meio que está ali na ‘zueira’ na política. O eleitor e a eleitora têm sempre que considerar que a pessoa em que ele está votando está assumindo um cargo público, está gerindo dinheiro, está discutindo assuntos de Estado, definindo rumos de educação, investimentos, política tributária, se o imposto vai baixar ou aumentar, ou seja, são essas pessoas que ficam fiscalizando o uso do dinheiro público. Então a pessoa tem que ser capacitada. Tem que se descobrir, pesquisar, não é fácil, mas é assim”, acrescenta o chefe do Cartório Eleitoral de Rebouças.
Tavarnaro também reforça que é necessário estudar a vida pregressa do candidato. “Na minha opinião, a escolha dos representantes deve levar em conta, em primeiro lugar, a honestidade do candidato, e isso pode ser conferido a partir da sua vida pregressa, ou seja, as coisas que ele fez no passado, seja no ambiente público ou no privado. Com essa avaliação, já podemos descartar muitos dos concorrentes. Outro ponto importante é análise das propostas, ou seja, o que o candidato pretende fazer, se eleito, bem como quais são as ideias que defende”, considera o ex-juiz do TRE-PR.
Além disso, ele destaca que é necessário o acompanhamento da vida do candidato após este ser eleito. “Embora o representante não esteja vinculado ao que prometeu, os eleitores devem exigir o cumprimento das promessas, sob pena de desprestigiá-lo em uma próxima eleição. Nesse sentido, considero que, tão importante quanto a análise a ser feita agora, no processo eleitoral, é o acompanhamento do exercício do mandato”, orienta Tavarnaro.
É possível consultar todos os candidatos e a informações que eles deram para a Justiça Eleitoral no DivulgaCandContas (divulgacandcontas.tse.jus.br).
Outras ferramentas podem ser úteis para pesquisar sobre a vida e as propostas dos candidatos. “E hoje a internet é a nossa maior ferramenta. Ela está aí com a história, então não custa nada para o eleitor dar um google, pesquisar se já teve uma matéria, algum projeto de lei que ele apresentou ou algum escândalo que já foi envolvido”, finaliza Marco Aurélio Canever.
Um hacker pode invadir a urna eletrônica?
Ao contrário do que muitos pensam, um hacker não tem como invadir uma urna durante o período de votação. E o motivo é o mais simples: Nenhuma urna fica conectada à internet.
Mas pode invadir os computadores da Justiça Eleitoral que fazem a transmissão ou a apuração dos votos? Antes de serem transmitidos ao TSE ou apurados, os votos de cada seção eleitoral são impressos. Sim, impressos. O boletim de cada urna do país é impresso contabilizando os votos antes dos dados terem contato com a internet (o que ocorre quando eles são transmitidos). Para a transmissão ao computador central do TSE, as mídias são transportadas até as sedes dos cartórios eleitorais do país.
Depois de concluída a eleição, cada Cartório Eleitoral do país faz um fechamento, compara os resultados impressos de cada urna daquela região, com o resultado apurado pelos computadores do TSE. Logo há esta checagem de resultados e confirmação dos números antes de qualquer candidato ser diplomado e poder assumir o cargo.
Texto: Lenon Diego Gauron