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Professores têm trabalhado mais na quarentena e contam como estão os alunos

03/07/2020

Professores têm trabalhado mais na quarentena e contam como estão os alunos

A rotina de trabalho dos professores sofreu drásticas mudanças por conta da pandemia. Tanto nas escolas da rede pública, como nas escolas da rede particular de ensino, a única forma de ensino possível atualmente é a virtual, seja através de aulas gravadas ou de aulas em plataformas digitais que permitem transmissão em tempo real. Em ambos os casos, a interação dos alunos e professores mudou muito, foi transferida para as telas dos computadores ou celulares.

A professora Rosicléia de Oliveira, Cléia, que leciona nos colégios estaduais Duque de Caxias e Florestal Presidente Costa e Silva relata que para auxiliar os alunos, sobretudo na disciplina de Matemática, o trabalho é constante.  “Não paramos nem nos finais de semana e feriados e não é uma questão de organização de tempo e sim de suprir as necessidades do estudante”, explica.

Segundo ela, essa nova forma de educação ainda não foi totalmente assimilada. “No geral, até que haja uma adaptação e se torne rotina, não está sendo fácil nem para o estudante tampouco para o professor”, diz.  A professora conta que para muitos alunos falta organização e disciplina para seguir esse formato de aula. Sem coordenação, diversos estudantes não acompanham as disciplinas todos os dias, como faziam na escola, e deixam as aulas e atividades se acumularem, o que aumenta o grau de dificuldade.

A professora Luciane G. Ferreira, que dá aulas da disciplina de História no Colégio Estadual Xavier da Silveira, confirma esse fato e chama a atenção para a necessidade de apoio que os alunos mais jovens têm na Educação à Distância (EAD). “Se no presencial já é difícil, em EAD torna-se mais complexo ainda, principalmente com os menores (do Ensino Fundamental), que ainda não têm muita autonomia, nem entendimento, nem maturidade suficiente para estudarem ‘sozinhos’", enfatiza.

Segundo ela, quem assiste regularmente às aulas está acompanhando o conteúdo, entretanto a professora cita que há outros fatores que também influenciam na aprendizagem. “Acredito que para alguns alunos (aqueles que estão se dedicando mais: assistindo as aulas pela TV ou pelo youtube) e resolvendo todas as atividades, está sendo um pouco mais tranquilo; pelo menos na minha disciplina, que é teórica. Mas, não é fácil, porque muitos não têm acesso às tecnologias, outros tinham dificuldades de aprendizagem, além da falta de apoio da família (que já era a realidade de muitos)”, explica Luciane.

Outro fator que está influenciando o processo de aprendizagem, de acordo com o professor do curso de Informática do Instituto Federal do Paraná (IFPR), Francis Baranoski, é interação limitada entre alunos e professores no contato remoto, digital.  “É importante salientar que a avaliação da aprendizagem não é somente a aplicação de um exercício ou prova para a atribuição de conceito ou nota. A avaliação da aprendizagem é um processo que ocorre no dia-a-dia em sala de aula em que há a interação entre aluno e professor, e o docente percebe as particularidades, potencialidades e dificuldades dos alunos que são apresentadas pelos mais diversos tipos de feedback que só o professor é capaz de identificar”, afirma. Segundo ele, é a assim que o docente consegue adequar as abordagens de conteúdos, para que haja a evolução da aprendizagem dos estudantes.

Francis conta que trabalha com disciplinas da área da Computação, relacionadas à programação de computadores. “A maior parte dos alunos não teve contato prévio com este tipo de disciplina técnica em séries anteriores, pois não faz parte do currículo do ensino básico, fundamental e médio, e as atividades exigem bastante raciocínio lógico-matemático, o que muitas vezes resulta em dificuldades no aprendizado para alguns alunos. Isso também é agravado pela falta de interação entre o aluno e o professor imposto pelo isolamento social”, relata.

Acesso à tecnologia

Na nossa região, nem todas as famílias têm celulares, computadores e acesso a uma internet veloz para que os estudantes acompanhem tranquilamente às aulas. A professora de história do Colégio Xavier frisa a questão da desigualdade social.

“Sabemos que a desigualdade social é um problema muito grande. Não podemos ser tão otimistas e ingênuos e achar que esse sistema está atingindo a todos, é claro que não está. Na escola que eu atuo, ainda temos uma realidade um pouco melhor, mas, sabemos que em outras escolas têm muitos mais alunos sem acesso”, diz Luciane.

A dificuldade em ter acesso à tecnologia também é observada pela professora de matemática dos colégios Duque de Caxias e Florestal. “O acesso à tecnologia é problema de alguns devido a não terem o acesso à internet, a não terem celular, computadores/notebooks ou até quando na família tem 3, 4 estudantes e um único aparelho”, comenta Cléia.

E o professor do IFPR complementa: “Além da questão da falta de acesso existe também a questão da dificuldade de adaptação dos alunos a esse modelo de ensino remoto que utiliza preferencialmente os meios digitais sem a interação presencial com o professor, modelo este imposto pelo isolamento social. O que nos leva a crer que sim, o acesso e uso da tecnologia têm sido um problema para muitos alunos”, diz.

Nas escolas da rede estadual de ensino, para os alunos que não têm a possibilidade de acompanhar as aulas à distância ocorre a entrega de materiais impressos, para que eles façam e devolvam aos professores, relata Luciane. “Nas turmas dos menores, ainda temos um grande número de alunos que não têm acesso à plataforma. Para estes, são impressas atividades na escola e entregues às famílias, porém, muitas nem vêm buscar, outros fazem incompletos e outros nem devolvem à escola. Aqui entramos em outro problema: o social”.

Segundo ela, nas turmas dos terceiros anos do segundo grau em que leciona, pelo fato de os estudantes estarem se preparando para o Enem e para o vestibular o percentual dos que acompanham a EAD é próximo de 100%. 

Equipe pedagógica

Na rede estadual, além dos professores, os demais colaboradores das escolas também se envolvem com a EAD. “O trabalho esta sendo em equipe, a direção, as pedagogas, funcionários não estão medindo esforços em nos ajudar e nos dar apoio a todo momento. Ligam para os alunos que não estão acessando para saber o porquê e se estão precisando de ajuda. E quando não se tem resultado, é ligado para os pais. E se mesmo assim ainda não tiver resultados é pedido ajuda ao Conselho Tutelar para pôr a família em contato com a escola”, comenta a professora Cléia.

Trabalho extra para os professores

Todos os professores estão tendo mais trabalho para lecionar à distância. E os motivos são os mais diversos, desde as demandas do próprio ambiente digital às dúvidas dos estudantes e seus diferentes ritmos de estudo.

Na rede estadual de ensino, as aulas são gravadas por poucos professores e transmitidas a todos os estudantes do Paraná por TV, You Tube e aplicativo. Os professores convencionais das escolas enviam atividades aos alunos através do Classroom.  “Neste sistema temos que entrar todos os dias e postar atividades, recados no mural, corrigir atividades, interagir com os alunos. Além do preenchimento do RCO (Registro de classe online - antigo livro de chamadas), ainda temos as meets (reuniões virtuais, com equipe da escola e alunos) e os recados e comandos enviados pela escola através do WathsApp”, comenta Luciane sobre sua rotina, que se tornou mais trabalhosa.

Além das exigências da plataforma de ensino a distância Classroom, os professores precisam ser pacientes e versáteis com os alunos e seus ritmos de estudo, segundo Cléia. “Não estamos em contato direto com os estudantes e não sabemos se eles estão absorvendo ou não o conteúdo e isso nos preocupa muito. É angustiante enquanto uns estão em dia com as aulas e atividades, outros no começo. Então nós, enquanto professores, temos que a todo tempo estar começando e recomeçando”, afirma.

No IFPR, são os próprios professores têm gravado vídeos com os conteúdos para que os alunos assistam. “Tem sido bem mais trabalhoso dar as aulas virtuais. A dinâmica e abordagem de atividades à distância são completamente diferentes da abordagem presencial”, comenta Francis. Segundo o professor, o  tempo de apresentação em vídeos “necessita ser mais curto e a mediação desse conteúdo deve ser mais direta para manter a atenção do aluno durante o vídeo, o que demanda maior tempo para adequar assuntos complexos a essa forma de ensino em relação ao ensino presencial”.  

Família

Sem a presença física do professor junto ao aluno, compete aos pais e demais familiares ajudarem os estudantes, o que nem sempre ocorre.  “Muitas famílias não estão ajudando e cobrando dos seus filhos! Muitos preferem que seus filhos reprovem a ter que cobrar que seu filho se dedique, assista às aulas e faça as atividades. Muitas famílias jogam para a escola a responsabilidade do aprendizado, o que não é correto, pois a casa, a família sempre teve (ou deveria ter) um papel fundamental no processo de ensino-aprendizagem”, diz Luciane.

Além da falta de apoio familiar, segundo Cléia, alguns estudantes não têm em suas casas sequer um ambiente tranquilo para estudar.

E as aulas de Educação Física?

O professor de Educação Física Euclides Ribeiro Neto que leciona no Colégio Sesi, que é particular, conta como está sendo ter que trabalhar à distância. “Inicialmente é um sentimento estranho, pois eu tenho uma metodologia em média 70% prática, focando a atividade física e saúde, além dos esportes tradicionais. E com essa nova realidade isso mudou, pois grande parte das aulas é através de ferramentas digitas. Porém a ênfase em prática de exercícios físicos continua, a parte prática é realizada através de vídeos com exercícios que proponho, assim mantendo o aluno ativo”, relata.

No Colégio Sesi, todas as aulas são ao vivo à distancia, ou seja, os alunos e o professor devem estar conectados nos horários de aula, em um espaço digital específico. Outros colégios particulares de Irati, como o São Pedro Canísio e o Dom Bosco, também oferecem aulas desta forma.

Segundo Euclides, no início, grande parte dos alunos apresentou certa dificuldade na disciplina de Educação Física, mas a adaptação foi rápida. “Temos relatos de alunos que estão achando muito bom, pois existe a opção de rever as explicações e isso facilita no processo de aprendizagem. Porém é muito individual, pois algumas pessoas têm mais dificuldades com os sistemas de trabalho a distância”, diz.

Entretanto, aprendizados adquiridos coletivamente pela prática esportiva estão prejudicados pelo isolamento social. “A prática esportiva escolar desenvolve no aluno vários aspectos não apenas físicos, mas cognitivos também. Podemos citar fatores como trabalho em equipe e tomada de decisão que são estimulados na prática dos esportes e jogos coletivos. Outro prejuízo é a coordenação motora, a qual a não prática de gestos motores leva o aluno a perca de algumas habilidades adquiridas ao longo do tempo”, afirma o professor.

Texto: Letícia Torres/Hoje Centro Sul

Fotos: Arquivo/Hoje Centro Sul

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