15/09/2022
Com diversos nomes, o cigarro eletrônico foi introduzido no mercado prometendo ser mais seguro e eficaz contra os cigarros convencionais, no entanto, médicos afirmam que há estudos que comprovam que os dispositivos causam os mesmos problemas, além de serem proibidos. Já o Instituto Nacional de Câncer (INCA), alerta que o uso de cigarro eletrônico aumenta em mais de três vezes o risco de experimentação de cigarro convencional
Popular principalmente entre os jovens, o cigarro eletrônico, também conhecido como vape, é um dispositivo eletrônico com variados formatos que contém uma bateria e um espaço para ser colocada uma substância líquida concentrada de nicotina. O dispositivo aquece esse líquido e o vapor é inalado por quem está fazendo o uso. Esse tipo de cigarro foi disponibilizado no mercado com a promessa de ser um substituto do cigarro convencional, no entanto, não comprovação da eficácia no combate ao tabagismo e estudos que relacionam o uso do dispositivo a doenças. Por isto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proíbe desde 2009 todos os tipos de dispositivos eletrônicos para fumar, incluindo os de cigarros eletrônicos, conforme resolução RDC nº 46. A proibição inclui a comercialização, a importação e a propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar.
Cigarro eletrônico faz mal?
Apesar da promessa de ser uma opção menos danosa à saúde e supostamente ajudar no combate ao consumo dos cigarros tradicionais, o médico pneumologista Helder Vinícius Ribeiro afirma que não há diferença entre os dois produtos e destaca o mal que o dispositivo pode fazer. “O cigarro eletrônico faz mal à saúde, tanto que é proibido no Brasil desde 2009 pela Anvisa. Ele contém substâncias tóxicas e cancerígenas assim como o cigarro comum. Ele traz o risco de desenvolver enfisema pulmonar, bronquite, sinusite, câncer, problemas cardíacos e infecções respiratórias”, explica o pneumologista, que atende pacientes em Irati e Ponta Grossa.
Mesmo não sendo consumido da mesma forma que o cigarro tradicional, e de não ter alguns dos componentes presentes no cigarro tradicional, o cigarro eletrônico tem em sua composição a nicotina – substância que causa vício e dependência. Por conta disso, o consumo do cigarro eletrônico não é mais saudável e pode resultar nas mesmas doenças.
O médico especialista em Clínica Médica e Nefrologia Frederico Guaurino de Oliveira Junior explica como é o funcionamento dos cigarros eletrônicos. “O cigarro eletrônico tem um líquido com um mecanismo vaporizador que tem bastante nicotina ali. Na verdade, a única substância que tem nele, a princípio, é a nicotina e alguns aromatizantes, mas o problema dele é a nicotina, que é uma substância que causa dependência e pode causar algumas doenças cardiovasculares e problema no pulmão, assim como o cigarro tradicional. Tá certo que ele não tem tantas substâncias oncogênicas (que podem causar câncer) assim como o cigarro comum, mas o dano ao pulmão é praticamente o mesmo e as doenças cardiovasculares também são as mesmas”, detalha o especialista.
Estudos
Além disso, o uso de cigarros eletrônicos por pessoas não fumantes pode levá-las a desenvolver o vício inclusive nos cigarros tradicionais. De acordo com um estudo do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o uso de cigarro eletrônico aumenta em mais de três vezes o risco de experimentação de cigarro convencional e mais de quatro vezes o risco de uso do cigarro. “Nossos resultados mostram que o cigarro eletrônico aumenta a chance de iniciação do uso do cigarro convencional entre aqueles que nunca fumaram, contribuindo para a desaceleração da queda no número de fumantes no Brasil”, destaca a coordenadora de Prevenção e Vigilância do INCA, a médica epidemiologista Liz Almeida.
O artigo analisou 22 estudos de diferentes países, totalizando 97.659 participantes da pesquisa para o desfecho de experimentação. Para o desfecho de uso atual do cigarro convencional (uso nos últimos 30 dias), foram analisados nove estudos também de diferentes países, totalizando 33.741 indivíduos.
Mesmo que o cigarro tradicional já tenha saído de moda, se comparado às décadas anteriores, o tabagismo ainda é uma das principais causas de mortes, doenças e custos para o sistema de saúde, além de promover uma piora na qualidade de vida de quem faz o uso. Apesar disso, um retrocesso vem ocorrendo com a popularização dos cigarros eletrônicos principalmente por se tratar de um produto que tem o seu público-alvo a população mais jovem. Enquanto o cigarro tradicional era sinônimo de glamour e era divulgado inclusive em filmes e comerciais com celebridades no passado, os vapes seguem o mesmo caminho atualmente sendo impulsionados por influenciadores digitais e famosos da internet.
A Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 apontou que 0,6% da população já utilizava dispositivos eletrônicos para fumar no país, naquele ano.
Outra pesquisa recente do Covitel (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas Não Transmissíveis em Tempos de Pandemia), realizada pela Vital Strategies e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), apontou que um em cada cinco jovens no Brasil, na faixa de 18 a 24 anos de idade, usa o cigarro eletrônico.
Cigarro eletrônico é proibido
A Vigilância Sanitária de Irati reitera que é proibido o comércio de cigarros eletrônicos, como e-cigarette, e-ciggy, e-pipe, e-cigar, heat not burn, Pods, Vaper, e quaisquer derivados. Mesmo com a proibição da comercialização, importação e propaganda de cigarros eletrônicos em todo o Brasil, esses produtos podem ser facilmente encontrados à venda através da internet ou mesmo no comércio de rua.
Se os dois fazem mal, por que somente um é proibido?
Devido a sua composição, o cigarro eletrônico pode causar tanto prejuízo à saúde quanto os tradicionais, feitos de papel ou palha. No entanto, os cigarros tradicionais de fabricação nacional continuam permitidos e à venda, inclusive, com arrecadação de impostos em cima do produto.
Mesmo com uma avalanche de informações ao longo dos anos sobre o mal que o cigarro causa para a saúde, o médico Frederico Guaurino de Oliveira Junior atribui a continuidade do cigarro tradicional à economia e à indústria. “O cigarro tradicional está muito atrelado à indústria do tabaco, que já é uma indústria estabelecida no Brasil. Tem a questão dos fumicultores, que a gente tem aqui na região, então tem toda essa logística que para ser proibido o cigarro tradicional se geraria um impacto muito grande tanto na geração de impostos para o país, quanto de emprego, pois a cadeia de emprego é enorme. Aqui na região temos muita gente que depende do tabaco e na questão do cigarro eletrônico não, a única substância que tem ali é a nicotina e não é uma coisa que é produzida aqui no Brasil. Então é muito mais fácil para o governo proibir o cigarro eletrônico do que o tradicional”, detalha o médico.
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No ponto de vista dele, é improvável que um dia o cigarro tradicional seja retirado do mercado brasileiro. “Proibir o tradicional eu acho que vai ser muito difícil, praticamente impossível para falar a verdade, porque isso gera muito imposto para o país por conta do cigarro tradicional e o tabaco”, acrescenta.
Vale lembrar que nenhum tipo de cigarro é seguro. Não existem doses seguras de uso e a sua utilização causa danos a curto e longo prazo. “Nenhum tipo de cigarro, seja com pilha, seja ‘estilo pen drive’ é seguro. Assim como o narguilé e o cigarro de palha. Uma hora de narguilé equivale a fumar mais de 60 cigarros. Um cigarro de palha equivale a pelo menos três cigarros comuns”, explica o médico.
Cigarro eletrônico não é uma alternativa
Os cigarros eletrônicos surgiram no mercado supostamente como uma opção para quem queria largar o cigarro tradicional. Anos depois, a falsa promessa de um dispositivo que causasse menos problemas à saúde não se efetivou. Pelo contrário: com mais opções no mercado, o dispositivo se tornou popular entre os jovens e, mesmo proibido no Brasil, ele está presente em vídeos nas redes sociais, em festas e eventos em geral, promovendo o tabagismo.
Apesar de serem produtos diferentes e funcionarem de maneiras distintas, todos os tipos de cigarros trazem malefícios.
Recentemente uma nova doença resultante de uma lesão pulmonar foi associada ao uso de cigarros eletrônicos, explica o pneumologista Helder Vinícius Ribeiro. “O cigarro eletrônico inclusive pode causar uma doença respiratória aguda e grave pela inalação dos diluentes da nicotina chamada Evali, sigla em inglês para uma doença pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico. Esta doença cursa com falta de ar intensa, tosse, dor no peito, com risco de internação hospitalar por insuficiência respiratória”, descreve o médico.
Até o ano passado, Irati possuía um programa de combate ao tabagismo coordenado pela Secretaria Municipal de Saúde que era aberto ao público em geral e que realizava orientações médicas e debates para os interessados em parar de fumar. Atualmente, o programa não está sendo mais realizado no município.
Tabagismo mata 8 milhões de pessoas por ano
A Organização Mundial da Saúde aponta que o tabaco mata mais de 8 milhões de pessoas por ano. Mais de 7 milhões dessas mortes resultam do uso direto desse produto, enquanto cerca de 1,2 milhão é o resultado de não-fumantes expostos ao fumo passivo. O Dia Nacional de Combate ao Fumo, comemorado no dia 29 de agosto, reforça a importância de parar de fumar.
Como parar de fumar?
O médico pneumologista Helder Vinícius Ribeiro destaca o primeiro passo para que alguém consiga parar de fumar definitivamente é a iniciativa própria, a vontade de querer mudar a saúde para melhor. Ele sugere que, com acompanhamento médico, as chances de eficiência do tratamento são maiores. “A melhor forma é querer. 70% do parar de fumar é força de vontade, determinação, decisão de mudar de vida e coragem para enfrentar o caminho do abandono do fumo. Remédios ajudam a parar, mas sozinhos não têm efeito. A pessoa precisa querer parar de fumar, aí o remédio é capaz de ajudar. Remédio nenhum faz parar de fumar se a pessoa não tiver força de vontade. Ajuda profissional é fundamental, existem técnicas comportamentais que ajudam a evitar a vontade de fumar e diminuir a fissura e recaídas”, explica o pneumologista.
Outra dica é eliminar os gatilhos mentais que causam a vontade de fumar. Também eliminar os cinzeiros, anotar o horário em que fumou o último cigarro, começar a fumar cada dia em um horário mais tarde até parar definitivamente, e contar aos mais próximos que seu objetivo é parar de fumar, pode auxiliar na nova fase da vida.
Chicletes e adesivos à base de nicotina também podem, quando associados a um acompanhamento médico e psicológico adequado, promover uma vida longe de qualquer tipo de cigarro.
Já para quem não fuma, passar longe também os cigarros eletrônicos é a melhor forma de evitar doenças respiratórias e cardiovasculares.
Lenon Diego Gauron