Agentes funerários acompanham a dor das famílias que vivenciam a morte sem despedida

Por Redação 4 min de leitura

Familiares, amigos, e os próprios profissionais que atuam no setor funerário não veem os corpos das vítimas de Covid-19. Esse tem sido um dos aspectos de difícil assimilação nas mortes decorrentes da contaminação pelo coronavírus

As funerárias trabalham para proporcionar uma despedida digna, pois o momento da morte é difícil por sua natureza. Durante os velórios, familiares e amigos podiam se reunir e compartilhar o último contato com o ente querido que falecesse. Entretanto, quando a causa da morte é Covid-19, ou suspeita da doença, isto não é possível. Nem os agentes funerários, nem os familiares veem o corpo.  

“A gente sempre quer fazer o melhor para as famílias e agora acabamos tendo que passar por isso de não deixar abrir o caixão. Quando o óbito é por Covid-19 o corpo sai do hospital lacrado no saco de remoção, é colocado na urna e lacrado para ser sepultado”, relata Edmilson José Ferreira Junior, proprietário da funerária Nossa Senhora da Luz de Irati.

Ele conta que muitas pessoas não aceitam a questão de não poderem se despedir do corpo, de não fazer um velório, o que as deixa abaladas. Com isso, mesmo tendo conhecimento a respeito dos protocolos de segurança, no momento da emoção acabam não aceitando esta dolorosa exigência.

Roseli Silva, proprietária da Funerária Irati, comenta que fica sem palavras em algumas situações. “Nós temos coração igual a todos, sofremos muito ao ter que dizer para uma pessoa que ela não pode ver seu parente pela última vez. Tem dias que vamos para casa acabados. O serviço funerário é muito importante para a sociedade, mas nós também somos humanos e sofremos com a dor do outro, ficamos sem palavras para consolar as famílias”, diz.

Nas mortes por Covid-19 a família reconhece o corpo por meio de foto e não há mais nenhum contato visual com o falecido a partir do momento em que o cadáver sai do hospital e passa para o serviço funerário. Isto  gera insegurança e torna ainda mais difícil a aceitação da morte, como frisa o proprietário da funerária Nossa Senhora da Luz. 

“As famílias ficam com o sentimento de saber: ‘Será que é mesmo meu familiar que está ali?’. Nem nós vemos o rosto, isso é o mais complicado dessas mortes. Existem também aqueles que são sepultados com suspeita de Covid-19, depois sai o resultado negativo do exame e vem a dor maior para a família, por não ter se despedido e feito um velório. As percas são sempre tristes, mas nesse momento estão ainda mais”, afirma Edmilson Júnior.

A psicóloga clínica Rafaela Maria Ferencz comenta a importância de o ser humano encerrar ciclos durante a vida.  Segundo ela, a perda de um ente querido sem poder se despedir em um funeral  faz com que este ciclo não seja encerrado por completo.  “Ver a pessoa pela última vez, dizer as últimas palavras, fazer uma oração, tocar e se despedir faz com que o ser humano entenda a situação e feche o ciclo de convivência e entenda que a partir dali existe uma separação”, explica a psicóloga.

A falta deste ritual de separação tem sido observada constantemente pelos agentes funerários. Eles presenciam a dor das pessoas ao se despedirem de alguém que amam e que entrou em um hospital devido aos efeitos da contaminação pelo coronavírus e que não pôde mais ser visto ou tocado. “Eu tenho acompanhado famílias que perderam entes queridos, que tiveram até que optar pela cremação. Sabemos que